Contenção Ou Liberdade: O Que Pode O Corpo Na Escola?

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOMOTRICIDADE I CONGRESSO INTERNACIONAL DE PSICOMOTRICIDADE XIV CONGRESSO BRASILEIRO DE PSICOMOTRICIDADE

CONTENÇÃO OU LIBERDADE: O QUE PODE O CORPO NA ESCOLA?

Adriana Andrade Alves
Mestranda em Artes, Cultura e Linguagens,
especialista em Psicomotricidade, Pedagoga
adriana.aalves@yahoo.com.br

Camila da Silva Perrotta
Especialista em Psicomotricidade e em docência na Educação Infantil, Pedagoga
camila.sperrotta@gmail.com

Clara de Oliveira Jucá Quintão
Especialista em Educação Física Escolar, aluna da especialização em Psicomotricidade
claraquintaojuca@gmail.com

Cristiane Clemente Suzano
Especialista em Psicomotricidade, Pedagoga
crissusano@gmail.com

Katia de Souza e Almeida Bizzo Schaefer
Psicomotricista, Pedagoga, Doutora em Educação
katia.b.schaefer@gmail.com

Raianne da Silva Alves Bernardo Thomaz
Mestranda em Educação, especialista em Psicomotricidade, Pedagoga
raiannebernardo95@gmail.com

Raquel Nunes Netto Rodrigues
Professora de Educação Física, aluna da especialização em Psicomotricidade
netton.raquel@gmail.com

Resumo:

Este trabalho objetivou investigar o lugar dos corpos na escola através do discurso dos sujeitos que a habitam, entendendo suas limitações e potencialidades. Para tanto, a pergunta O que pode o corpo na escola? foi levada, em forma de questionário, para professores, pedagogos, técnicos e familiares, de instituições públicas e privadas, da Educação Infantil ao Ensino Médio, na cidade do Rio de Janeiro.

Os estudos de Platão, Descartes e Foucault ajudam a entender o processo de docilização e controle dos corpos ligado a uma lógica escolar eurocêntrica predominante no Brasil, enquanto os estudos de Spinoza nos inspiraram a pensar na potência dos corpos e na pergunta central da pesquisa. Em Psicomotricidade, houve a contribuição de Wallon, Lapierre, Aucouturier, Mastrascusa e Franch para refletir sobre a valorização da potência corporal e urgência da desconstrução da dicotomia corpo e mente.

Concluiu-se o quanto o discurso sobre o lugar do corpo avançou para uma concepção de maior favorecimento do movimento, com práticas de valorização do brincar livre, das ações de movimentos amplos e em situações cotidianas de liberdade corporal. Entretanto, a pesquisa apontou que ainda predominam práticas que garantem o controle desses corpos, na tentativa de enquadrá-los em padrões de comportamento que provocam marcas corporais prejudiciais ao sujeito.

Tais questões ajudam a evidenciar a necessidade de transformação de valores e práticas em relação ao corpo, de forma que os sujeitos se relacionem com maior potência consigo, com os outros e com o ambiente.

Palavras-chave: Psicomotricidade; controle do corpo; potência corporal; práticas escolares.

Introdução

Nós somos nosso corpo. Toda educação é educação do corpo. A ausência de uma atividade corporal também é uma forma de educação: a educação para o não-movimento – educação para a repressão.
Strazzacappa

O presente trabalho tem por objetivo investigar o discurso oriundo dos sujeitos que constituem a escola sobre os corpos que a habitam. O desejo de ouvir esses sujeitos se deve aos estudos na área da Psicomotricidade, da Filosofia e da Educação e ao entendimento de que o corpo é compreendido de maneira diversa em nossa sociedade, portanto, as expectativas sobre o lugar que ele ocupa na educação também pode variar bastante.

Desse modo, cabe, inicialmente, analisar o significado de corpo em diferentes perspectivas. Ao dialogar com alguns pesquisadores na área da Educação ou na área da Filosofia, há uma abertura para compreensão de conceitos sobre o termo corpo, percebendo-o como algo que se comunica, ou seja, que permite uma expressão corporal, que está vinculado ao bem-estar consigo mesmo, com a sociedade e com o ambiente em que vive.

Fala-se do corpo ligado à natureza, do corpo como fonte de prazer, como canal de comunicação entre o interior e o exterior, ou seja, nestas áreas já podemos perceber discussões sobre um corpo que não é necessariamente apenas físico.

Desde a antiguidade, na Grécia, o corpo é motivo de estudo e estranhamento e as definições referidas a ele variam muito, causando rejeição ou interesse. Para Platão (2011), na obra A República, no livro IX (582a - e; 583a-e), o corpo aprisionava a alma e, na junção dessas duas partes, a alma se dividia em duas: alma do intelecto, considerada superior; e alma do corpo (ligada às paixões, ao desejo sexual, parte irracional), considerada inferior (PLATÃO, 2011, p. 281-282). O corpo era visto como algo menor do que o intelecto.

Basta destacar o valor dado aos trabalhos realizados: trabalhos manuais e corporais eram destinados ao povo, incluindo os escravos, nos quais o intelecto não era percebido e o trabalho era vendido (quando não era trabalho escravo) por valores reduzidos, pela ideia de que qualquer um poderia fazer e produzir o que estaria à venda.

Em relação à intelectualidade da época, essa era destinada a uma minoria, com alto poder financeiro, que pagava para outros realizarem as tarefas corporais enquanto eles usavam o tempo para pensar, dialogar, refletir, filosofar...

Estes detinham o poder do conhecimento e da sabedoria e, desde os pré-socráticos, muitos cobravam caro por seus serviços do intelecto. Nas palavras de Platão, “A mim não me parece ser o corpo, por perfeito que seja, que, pela sua excelência, torne a alma boa, mas, pelo contrário, a alma boa, pela sua excelência, permite ao corpo ser o melhor possível.” (PLATÃO, 2011, p. 136).

Fica clara a ideia de Platão que a alma se sobrepunha ao corpo, sendo este último algo insignificante, sem valor, que, segundo ele, precisaria ser separado da alma para que fosse possível alcançar a verdadeira sabedoria.

Séculos depois, René Descartes reforçou a dualidade corpo e mente e foi um dos grandes responsáveis pela forma como a sociedade ocidental entende o que é corpo até os dias de hoje. Na quarta parte da obra Discurso do Método (2008), Descartes afirmou: “[...] assim, esse eu, ou seja, a alma, pela qual sou o que sou, é inteiramente distinta do corpo e é mais fácil de conhecer do que ele e, ainda que ele não fosse, ela não deixaria de ser tudo o que é” (2011, p. 36). Descartes pensava que poderia se imaginar sem corpo, mas jamais sem o pensamento, o que resultou na sua ilustre frase: “penso, logo existo”.

Descartes foi conhecido como um dos precursores do período do Iluminismo, no qual a sociedade europeia, berço da cultura ocidental, questionou o poder e o conhecimento da igreja católica, abrindo novas frentes de pensamento científico, nas quais o homem sábio, erudito, ganhava o poder de deter o saber. Nesse contexto, muitos estudiosos investiram em metodologias científicas para adquirir o conhecimento supostamente verdadeiro e único e Descartes foi um dos principais integrantes desse movimento.

Tempos depois, em sua principal obra, Ética, Spinoza (2011), através da razão exposta por conceitos lógicos-matemáticos, abordou a imaterialidade do corpo e a relação deste consigo próprio, com outros corpos e com a natureza. Resgatou o fragmento L de Heráclito (2012) – “ouvindo não a mim, mas ao lógos, é sábio concordar ser tudo-um” – e reformulou a compreensão do divino, de Deus. Para Spinoza, Deus era a natureza e uma essência única em todo o universo. Tudo o que estava compreendido no mundo, então, fazia parte da essência de Deus.

A partir dessa premissa, ele abordou o corpo, a ética, os afetos, a mente, enfim, provocou a quebra de muitos paradigmas, mostrando o quanto os filósofos se enganaram em relação ao mundo físico.
Apesar de seguir alguns preceitos cartesianos , principalmente na forma de organizar seus pensamentos, Spinoza contrariou o filósofo em muitas questões. Uma delas é que, para Spinoza, ninguém poderia conhecer a mente humana de forma adequada se não conhecesse da mesma forma adequada a natureza do nosso corpo (SPINOZA, 2011, p. 61).

Essa ideia ia de encontro ao pensamento cartesiano, já que Descartes preferiu ignorar o corpo, apesar de reconhecer sua falta de entendimento sobre ele, como se tal conhecimento não afetasse o que pensava sobre a mente.

Para Descartes, corpo e alma/mente eram substâncias distintas, enquanto, para Spinoza, corpo e alma/mente pertenciam a uma mesma substância.
Após tantos séculos, ainda nos encontramos em uma sociedade dualista, que, como Platão e Descartes, separa o corpo da mente e vê no primeiro o vilão que deve ser aprisionado para que o segundo se liberte. A ênfase nas questões intelectuais no âmbito escolar ainda busca aprisionar o corpo.

Levando essa questão para o contexto escolar, é possível perceber que o corpo ainda ocupa um lugar de vilão, necessitando de disciplina, proibição e obrigação. O espaço escolar se constituiu, como diz Foucault (2009), como uma “fábrica” de corpos submissos que, além de ensinar, passou a vigiar, hierarquizar e recompensar.

A busca de uma resposta: o que pode o corpo na escola?

Para entender o lugar que o corpo ocupa nas escolas, a pergunta O que pode o corpo na escola? foi levada para diferentes instituições educacionais da cidade do Rio de Janeiro, que lidam com a infância. Participaram, desta pesquisa, crianças, funcionários, professores, estagiários, coordenadores, técnicos e gestores de instituições federais, municipais, estaduais e da rede privada nos segmentos da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, os quais denominamos atores sociais no cotidiano escolar, pois compreendemos que esses sujeitos compõem o cenário da escola e estabelecem relações de interação entre si nos espaços do ambiente educacional.

Sem muitas explicações, deixamos a questão aberta para que pudessem responder. A intenção não era comparar escolas ou mapear os espaços de cada resposta, mas ampliar as possibilidades de escuta para diferentes contextos de convivência escolar.

Na perspectiva da relação e da troca de saberes entre os sujeitos, na qual cada sujeito constrói em si sua história de vida baseada em suas experiências, compreendemos que diferentes pontos de vista e formas de pensamento sobre o papel, a função e o lugar do corpo na escola também são e serão sempre distintos para cada um. O objetivo foi analisar como cada sujeito, considerando os diferentes setores que compõem o ambiente escolar, pensam sobre o que pode o corpo na escola.

Para este trabalho, recortamos na pesquisa os campos investigados de Educação Infantil e primeira etapa do Ensino Fundamental e as respostas que traziam a possibilidade de um corpo potente, livre para se expressar e atuar no espaço escolar, originadas por crianças e adultos que habitam e interagem nesse espaço, como também as respostas que indicavam o controle e a disciplinarização dos corpos, entendendo que cada um dos sujeitos investigados vive em cenários com diferentes realidades, vivenciando experiências que podem, poderiam ou deveriam afirmar a vontade de viver, levando-o a situar-se em um lugar de liberdade, de descoberta de si e do outro, mas também reforçando paradigmas e práticas de um corpo submisso, controlado e desprezado.

As reflexões nos convidam a repensar o caminho e isso significa repensar alguns paradigmas que ainda encontramos nas práticas do cotidiano de algumas escolas. Paradigmas esses que alimentam práticas pedagógicas que cerceiam o movimento natural dos corpos; movimentos e ações que mostram o desejo e interesse em conhecer, em aprender, em descobrir por meio da experimentação.

O capítulo I, da parte III, da obra Vigiar e Punir: história da violência nas prisões, de Michel Foucault, intitulado Corpos dóceis, nos mostra algo que pode levar-nos à reflexão sobre o corpo movido pela ação do outro pelo olhar paradigmático disciplinador, quando nos diz que:

A modalidade enfim: implica numa coerção ininterrupta, constante, que vela sobre os processos da atividade mais que sobre seu resultado e se exerce de acordo com uma codificação que esquadrinha ao máximo o tempo, o espaço, os movimentos. Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade, são o que podemos chamar as “disciplinas”. (FOUCAULT, 2009, p. 164)

Diante disso, será que na escola o corpo pode ser livre? Essa questão nos leva a uma importante reflexão sobre as práticas existentes nesse espaço, práticas de cerceamento e controle corporal de indivíduos no processo de ensino-aprendizagem, no intuito de buscar, nas relações entre os atores sociais presentes na escola, práticas inovadoras e olhares que garantam a possibilidade de ações e atuações de um corpo livre, com vontade de potência, livre para aprender e construir seu conhecimento pelas experiências de um corpo vivo, pulsante e ativo, quebrando antigos, porém ainda presentes, paradigmas de controle dos corpos.

Para viver o caminho da liberdade dos corpos é necessário investir nas relações, nos afetos que acontecem pelos encontros entre os sujeitos. Cada sujeito como ser único, capaz de afirmar-se na vida em sociedade através das relações com o outro e com o ambiente, baseados em conceitos e valores que possam garantir sua potência no reconhecimento de seu próprio corpo.

Ao escutar diferentes vozes de crianças e de adultos, que convivem em contexto escolar, no papel social ou profissional de alunos, pais, professores, gestores ou técnicos-administrativos, chegamos às respostas das crianças. O que elas – puro corpo com vontade de potência – têm a nos dizer e quais as condições de fala e de escuta?

É importante destacar que não há neutralidade. A concepção de criança que varia historicamente e que constitui nossa forma de se relacionar e de perceber a escola com seus sujeitos também informa algo, norteando todo este trabalho.

A pesquisa com crianças fundamenta-se em alguns pontos importantes, como a relação entre o pesquisador e pesquisado e a concepção de criança implícita na pesquisa. Será que é diferente quando o pesquisador já conhece a criança? Existe uma relação que não é imparcial, portanto, como ela aparece na pesquisa? As crianças respondem o que realmente pensam ou o que imaginam que queremos ouvir?

Diante dessas questões, sabemos que a imparcialidade tem relevância nas respostas, mas também entendemos que isso não exclui a riqueza da escuta do dito pelas crianças e a importância do tempo de ouvir sobre uma questão tão presente, mas tão pouco dialogada entre adultos e crianças nas instituições escolares.

O que as crianças acham que pode o corpo na escola?

Essa pergunta foi feita para elas na tentativa de tornar visível as muitas formas, faladas ou não, de como dizem que deve ser e de como enxergam seus corpos nesse espaço, suas possibilidades e as relações estabelecidas de descobertas, estranhamentos, transgressões e desafios a partir desses aprendizados.

O bebê, quando nasce, usa seu corpo para comunicar as sensações de prazer e desprazer, ele é só corpo, só o presente. A criança cresce e a linguagem se torna um marco importante, porém a comunicação corporal não deixa de estar presente sempre nessas comunicações, o tônus revelando confortos e desconfortos, implícitos ou não nessas falas, se tornando um aliado na percepção de suas emoções, continua afirmando que esse sujeito que cresceu continua sendo só corpo.

As crianças descobrem o mundo a todo momento, e brincam com seus elementos na tentativa de compreender e ressignificar a vida em seus jogos simbólicos, o corpo sendo a ponte de expressão dessas experiências.

É com o corpo que elas criam e transformam, quanto mais movimento, mais criação, conexões e relações, como afirma Wallon, citado no artigo de Guimarães (2008), Educação de corpo inteiro: “Wallon propõe que o ato motor – o deslocamento do corpo no espaço com cada vez mais desenvoltura e segurança – gera o ato mental. As primeiras ideias mentais das crianças nascem em seus movimentos.” (p. 25).

E qual relação estabelecem com seus corpos, já que eles são tão importantes para o seu desenvolvimento? Tiriba questiona: “quais as heranças filosóficas, culturais que nossos corpos ‘pós-modernos’ herdaram?” (2017, p. 2). Essa herança fala de uma valorização da mente, da razão, em distanciamento do corpo no âmbito da sensibilidade, da natureza, da emoção.

É uma cultura que ensina o que é e não é aceito pelos outros, que vê o movimento como bagunça, que ensina que é importante controlar o andar, o correr, o tempo de comer, fazer xixi, dormir. Ensinam que as crianças não sabem das coisas, que precisam ser ensinadas, revelando assim uma concepção de criança que ainda não é, que está sendo preparada para ser. E qual é o tempo do corpo em muitas escolas? Qual o lugar? Qual a sua importância? E o que acontece quando o corpo tem valor? Quais potências reverberam na experimentação dessa liberdade?

Esse corpo responde, se torna livre, criativo, autônomo e confiante, de modo que, quando a criança se vê diante de um desafio, experimenta o medo, a coragem, a alegria de ter conseguido ou a frustração acolhida e desejosa de novo investimento.

O corpo se empodera, se percebe capaz e, assim, é possível viver a experiência com bons afetos que se tornam marcas para toda a sua vida.
A escola que, por um lado, dociliza corpos, também está passando por um processo de transformação, refletindo sobre essa fragmentação como algo que prejudica, vendo a dimensão global do ser, sua expressão e criação como um caminho de potência.

Nesse sentido, é comum vermos na escola um discurso que entende o corpo como potência ao mesmo tempo em que apresenta uma prática que busca a docilização dos corpos. Essa contrariedade faz parte do cotidiano escolar e traz ainda mais subjetividade à questão apresentada: afinal, o que pode o corpo na escola? Não temos respostas prontas, mas um caminho que se constrói e se desconstrói ao caminhar e, para enriquecer essas reflexões, compartilhamos algumas respostas das crianças.

Ao perguntar a elas o que pode o corpo da criança na escola, tivemos as seguintes respostas:

– Pode andar, correr, pular... Pode brincar. Pode abraçar os outros. Pode ler. Pode escrever. Pode falar. Pode cantar.
– Pode fazer muitas coisas. Pode comer coisas saudáveis. Correr. Malhar. Desenhar. Pintar o rosto, o corpo.

Para esses sujeitos, o corpo pode muito! São crianças de três a cinco anos de uma escola pública da zona oeste do Rio de Janeiro que busca a expressão e a potencialização dos corpos, priorizando o brincar livre, a escuta e o cuidado com as crianças. As crianças expressaram esse movimento, verbalizando o que fazem nesse espaço.

Sobre os corpos dos adultos, o discurso delas foi bem distinto: “o adulto ‘pode escrever, ler. As pessoas gostam, podem, fumar. Podem ser ‘mandão’.”. Cabe destacar que elas verbalizaram situações que os adultos podem que são exatamente o que as crianças não podem. São crianças de Educação Infantil que ainda não aprenderam a ler e a escrever, mas que já demonstram interesse nesse aprendizado e que reconhecem essa potência no corpo dos adultos. Também não é permitido que elas fumem ou mandem em outras pessoas.

Devido à idade das crianças entrevistadas e do não domínio da linguagem escrita por elas, as perguntas foram realizadas oralmente, tendo a entrevista gravada para fins de pesquisa. Essa diferenciação na metodologia estimulou outras perguntas além da citada no início desse trabalho (o que pode o corpo na escola?). Foi assim que, em outra questão, elas destacaram a autoridade dos adultos sobre as crianças, ao responderem o que não pode o corpo do adulto na escola:

– O adulto não pode deixar bater na criança, claro que não. Não pode mentir, vir de tatuagem.
– Pode ser mandão. Ele manda nas crianças. Alunos, vamos brincar lá no solário!

É interessante perceber o reconhecimento da autoridade dos adultos em relação às crianças, como também a valorização desse lugar do adulto. As crianças legitimam essa autoridade e a entendem como proteção e manutenção de regras de convivência: “não pode deixar bater na criança, claro que não.”.

Naturalmente, reconhecem que o adulto manda e, assim, estabelece onde as crianças podem ou não ir (“vamos brincar lá no solário!”). Reconhecem e afirmam o controle de seus corpos e, ao responderem sobre o que o corpo do adulto não pode, curiosamente responderam o que o adulto diz que as crianças não podem (não podem bater, não podem desobedecer, não podem decidir onde brincar...). Na continuidade das respostas, uma se destacou, o que gerou um diálogo entre a pesquisadora e as crianças:

Criança 1: O professor não pode bater no aluno sem ter razão.
Pesquisadora: E se tiver razão...
Criança 1: Se tiver razão, ele pode. Só se merecer.
Criança 2: Não pode, só se sentir muita raiva.

Afirmar que o adulto – o professor – pode bater nas crianças trouxe à tona uma questão grave: até onde vai o controle do corpo da criança pelo adulto? Por conhecer a instituição e os professores dessas crianças, podemos garantir que não há qualquer tipo de violência física na escola por parte dos adultos que lá trabalham, apesar das próprias crianças acreditarem que o professor tenha esse direito. O assustador é elas acreditarem na legitimidade desse poder. O mesmo adulto que protege para que outras crianças não as machuquem é autorizado pela criança a bater, mas “só se sentir muita raiva”.

Em relação aos alunos do Ensino Fundamental, em outra escola pública da cidade, muitos falaram que o corpo pode fazer qualquer coisa, “ser livre, dançar, descansar”, porém, sabemos que isso quase não acontece. Principalmente a partir do Ensino Fundamental, o corpo acaba sendo doutrinado ao sistema cartesiano, de forma que todos têm que sentar, um atrás do outro, anotar tudo que é passado, realizar diversas tarefas, ignorando que esse corpo é uma forma do aluno se expressar e dizer aos professores a necessidade que aquele corpo precisa, o que lhe está faltando ou até mesmo o que tem em excesso.

Assim, alguns corpos que são ditos indisciplinados acabam sendo punidos, e, muitas vezes, acabam ficando sem o recreio ou até mesmo sem a aula de Educação Física, que costuma ser um dos únicos momentos em que os alunos saem da sala de aula emparedada e ficam mais ao ar livre e em pé, sem estarem sentado por horas numa mesma posição em carteiras desconfortáveis.
Diante dessas questões, cabe também ouvir os adultos na escola para saber o que pode o corpo na perspectiva deles.

O que pode o corpo na escola? Pelo olhar dos adultos...

No ambiente escolar, o movimento passa a ser a forma como o corpo é percebido, na maioria das vezes. Nas respostas de nossa pesquisa, ao falar o que pode o corpo na escola, essa relação direta com o movimento ficou bem clara:

– Andar, fazer exercícios, dançar, fazer gestos, sentar, olhar, ouvir, cheirar, marchar, fazer fila, pular cordas, jogar bola, rodar bambolê.
– Andar, sentar, falar, comer, beber, correr, enfim, movimentar-se, respeitando o espaço dos outros corpos.
– Podemos “tudo”. Corpo necessita de movimento e movimento é vida.
– Várias coisas! Se movimentar de várias formas, como andando, correndo nas aulas de Educação Física, jogando Ping Pong etc.

O corpo subjetivo, potente, perde percepção diante de um corpo físico que se movimenta quando permitido. A pergunta suscitou estranhamento e respostas diversas que nos possibilitaram mais reflexões sobre o tema e sobre a prática escolar. A escuta das diferentes vozes nos levou a algumas percepções que nos motivaram a também dialogar com a observação das práticas, já que as entrevistas se deram nas escolas em que nós trabalhávamos.

Ao confrontar as observações com as respostas e dialogar com o contexto das entrevistas de outras instituições, concluímos o quanto o discurso sobre o lugar do corpo avançou para uma concepção de maior favorecimento dos movimentos e das expressões, mas que, na prática, ainda se percebe que, mesmo considerando, prioritariamente, o corpo como a movimentação mais ampla das crianças, esta serve para mascarar o controle dos corpos, quando tal ação se dá de forma dirigida, com excesso de regras e condições.

Tal mascaramento também esconde as diversidades de cada sujeito, na tentativa de enquadrá-los em padrões ideais de comportamento que, quando não são possíveis, provocam rótulos e discriminações que podem gerar marcas negativas em seus corpos.

Diante de algumas falas que afirmavam que o corpo tem que ser disciplinado e obedecer, surgiu mais uma questão para ampliar nossas reflexões: o que é um corpo disciplinado? É um corpo que obedece a tudo e a todos? E de onde vem essa ordem que o corpo tem que obedecer? Como Strazzacappa (2001, p. 70) escreveu, “a noção de disciplina na escola sempre foi entendida como “não movimento”. As crianças educadas e comportadas eram aquelas que simplesmente não se moviam.

Foucault contribuiu para o entendimento dessa lógica escolar, denunciando a nítida sensação de não podermos fazer nada para mudá-la, ou seja, onde a ideia fatalista explicitada ganha força e esmaga as intenções de transformação e inovação de práticas escolares que visem a emancipação e a autonomia dos alunos. Na obra O governo de si e dos outros, referente ao curso entre 1982 e 1983, Foucault (2010) escreveu sobre a emancipação e a autonomia dos sujeitos, questionando a passagem do sujeito de um estado de minoridade para um estado de maioridade, ou seja, de um estado onde estava subordinado à obediência inquestionável aos detentores do poder intelectual, econômico ou social a um estado onde teria condições de questionar tais poderes e intervir na regulação dos mesmos.

Em outras palavras, alcançaria uma autonomia de pensamento e ação. Para Foucault, seriam poucas as pessoas que chegariam a esse patamar. Apesar da ideia de que a formação educacional agiria em prol da formação de sujeitos emancipados e autônomos (até hoje este discurso se encontra na maioria das propostas político-pedagógicas das escolas), na prática, não é assim que percebia funcionar.
Na obra Vigiar e punir: história da violência nas prisões, com a primeira edição em 1975, Foucault (2009) já denunciava o sistema de controle nas instituições educacionais, fazendo um comparativo com outras instituições como o quartel, o hospício e os presídios. Referiu-se aos sistemas de punição e aos suplícios nas duas primeiras partes do seu livro e, em seguida, destinou uma boa e significativa parte da obra à questão da disciplina, ao controle, à docilização dos corpos. Logo no início dessa parte da obra, relembrou Descartes na sua descrição sobre o homem-máquina em relação à busca do corpo útil e inteligível. Assim, Foucault levantou a questão do corpo diante de tais sistemas de controle: “Não é a primeira vez, certamente, que o corpo é objeto de investimentos tão imperiosos e urgentes; em qualquer sociedade, o corpo está preso no interior dos poderes muito apertados, que lhe impõem limitações, proibições ou obrigações.” (FOUCAULT, 2009, p. 132).
Ao descrever o que entendia por disciplina, o autor a relacionou à necessidade de domesticar o corpo, de deixá-lo em condições de obediência e servidão diante do sistema social. O corpo se tornaria uma ferramenta útil de produção e, como todas as ferramentas, precisaria que seus movimentos fossem minuciosamente controlados e calculados.

Essas reflexões vão ao encontro às respostas de alguns adultos: “O corpo não pode quase nada”; “O corpo pode ser docilizado para aprender”; “O corpo pode pouco. Pode ficar quieto”. Fica claro, que essa lógica é, pois, um discurso que ainda ocupa grande centralidade no que tange a compreensão do corpo na escola e abafa ou inibe as percepções que caminham na contramão.

Os depoimentos que reproduzem e validam a concepção de sujeito fragmentado autorizam práticas e premissas que reprimem o movimento e a agitação com a falsa ideia que, para aprender, o corpo precisa estar imóvel, estático, o que Lapierre e Aucouturier (2004) ressaltam como forma de privar a criança de seu meio de desenvolvimento mais autêntico e desvalorizar toda sua atividade criadora e busca pessoal espontânea.

Sob outra perspectiva, nos deparamos com falas que, em menor proporção, abrem espaço para repensar o corpo na escola, ao afirmarem que “o corpo pode se expressar”; “o corpo pode acolher”; “o corpo pode correr, pensar, pintar, abraçar”; “o corpo pode ser livre, brincar e experimentar.”.

Tais respostas reconhecem e validam o fazer espontâneo da criança que Lapierre e Aucouturier (2004) acreditam como possibilidade de atuar no sentido de uma educação aberta para a vida, para a criatividade, para a autonomia e para o desenvolvimento de todo o potencial do sujeito. Em suas palavras, “Não há vida sem movimento, e o fim do movimento próprio, para qualquer matéria viva, é a morte” (LAPIERRE; AUCOUTURIER, 2004, p. 41).

Em outra abordagem, eles dizem que “É necessário aceitar e reconhecer essas pulsões de vida, encontrá-las no seu nível mais primitivo, isto é, no seu nível corporal, não ‘recalcá-las’ mas, ao contrário, deixá-las se exprimir e favorecer a sua evolução progressiva até atingirem meios de expressão mais abstratos (LAPIERRE; AUCOUTURIER, 2004, p. 41).

Alguns entrevistados afirmam que o corpo pode muito e é livre na maioria das escolas pesquisadas, mas tal discurso não reflete a prática pedagógica desses mesmos profissionais que verbalizam sobre a importância desse corpo livre, ou seja, a liberdade e o poder dado ao corpo no discurso ganham outra dimensão na prática, pois as ações presentes em algumas das escolas observadas corroboram com a ideia de desvalorização do corpo e contradizem o discurso dos entrevistados.

Tiriba (2017, p.3) afirma que vivemos em uma sociedade que supervaloriza o intelecto em detrimento do corpo e este é posto em segundo plano, assim como as artes, sensações físicas, afetos, emoções, desejos e intuições. Sendo esse corpo alvo de adestramento para fim de uma melhor eficácia, o qual tal pode ser descrito no processo de “docilização”, retratados por Foucault (2009, p. 163), ele vai se tornando dócil e manipulável, utilizável, podendo ser alterado e facetado.

Apesar de todas as questões sobre o poder descritas por Foucault que aqui relatamos superficialmente, o corpo e sua potência estão na escola e já começam a ser percebidos não apenas como movimento, mas como potência, como evidenciam mais algumas respostas: “O corpo pode, para além de se movimentar, marcar lugares, ocupar espaços, dizer pensamentos, expressar angústias, calar sentimentos, guardar dores, fazer limite. O corpo se inscreve na história e escreve histórias não sem cortes e rasuras.”.

E foi assim que percebemos respostas em outra perspectiva, que possibilitou pensar na potência dos corpos para além dos movimentos visíveis. Quais movimentos invisíveis podemos perceber? Ao relacionar o corpo aos sentimentos, às dores, às inscrições na história de cada um, falamos de uma outra perspectiva corporal, a da potência de vida, fio condutor de aprendizagens.

Ao olhar para a complexidade da questão, esta, que, primeiramente, poderia parecer simples e já com respostas claras, ela ganhou evidência ao ser exposta, como ilustra o fato ocorrido ao entregar a questão, em uma das instituições.

Nesse momento, as expressões corporal e facial se modificaram ao ler a pergunta, demonstrando o desconforto que o questionamento sobre o corpo na escola traz para os adultos. Frases como “Nossa! Que difícil!”, “Pensei que iria responder rápido, mas quando parei para escrever, nossa! Precisei de tempo.” e “A pergunta não tem um direcionamento, né?” foram citadas nesse processo, por quem respondia a pergunta.

Diante de mais respostas, destacamos a de uma coordenadora de ensino de uma das instituições: “O corpo pode tudo na escola. É através do movimento que o indivíduo se manifesta e age no mundo. É através do movimento corporal que as pessoas se comunicam, trabalham, aprendem, sentem, vivem o mundo e são sentidos.”.

A fala da coordenadora se inter-relaciona com o que Carla Rinaldi descreve como escola: “as escolas são ambientes organizados que oferecem ao ser humano um espaço de vida.” (RINALDI, 2012, p. 17). Para essa autora, o corpo da criança é inseparável da mente e possibilita a imagem de uma criança competente, quando explica: “competente porque tem um corpo que sabe falar e ouvir, que lhe dá uma identidade e com o qual ela identifica as coisas. Um corpo dotado de sentidos que podem perceber o meio ambiente circundante [...] um corpo que é inseparável da mente.” (RINALDI, 2012, p. 170).

Para uma professora de dança entrevistada, “o corpo é potência em sua complexidade. Pode-se muito através do corpo, mas é preciso desconstruir muitos padrões para sentir e pensar o corpo na escola. É um mergulho profundo, necessário e urgente.”. Com isso há a consciência da limitação do entendimento por alguns atores sociais das possiblidades do corpo, o que torna essa questão um desafio “necessário e urgente” para descontruir paradigmas que afirmam a dicotomia corpo e mente em prol de uma supervalorização da mente.

A fala de outra professora rompe com outro paradigma, sendo este difundido na filosofia de Platão: “O corpo pode experimentar novos sentidos que constituem cada sujeito e que facilitarão na aprendizagem. O corpo será a porta de entrada para a construção de conhecimento significativo.”.

Para melhor esclarecer o lugar do corpo como fio condutor do processo de aprendizagem, podemos trazer a abordagem do psicólogo e educador Wallon, que relaciona o desenvolvimento infantil à relação intrínseca entre afetividade, motricidade e inteligência. Galvão, comentadora de Wallon, afirma que ele “propõe o estudo integrado do desenvolvimento, ou seja, que este abarque os vários campos funcionais nos quais se atribui a atividade infantil (afetividade, motricidade e inteligência).” (GALVÃO, 2011, p. 31).

Para dialogar com essas reflexões, destacamos mais uma resposta de uma professora entrevistada: “O corpo pode percorrer todos os espaços da escola, pode expressar sua liberdade e mobilidade, pode e deve ser visto como um todo e não só em partes.” A essa afirmação, podemos somar a resposta da psicóloga de uma das instituições pesquisadas, que diz que o corpo pode “dar visibilidade e assegurar a identidade do sujeito, com múltiplas dimensões e potencialidades, assim como novos desafios e descobertas. Autoconhecimento e autoestima, afetividade e sexualidade, corpo e experiência”.

Os afetos que ocorrem nas relações estabelecidas entre corpos, compõem o sujeito pelo poder de afetar-se e afetar o outro em tudo que vivenciam e experimentam. A potência de cada indivíduo é o que define e potencializa o lugar do corpo. O corpo na escola é constantemente afetado um pelo outro, assim como é afetado pelo ambiente em que está inserido.

A Psicomotricidade nos aponta princípios básicos para relações saudáveis vivenciadas em grupo. Na obra, Corpo em Movimento, Corpo em Relação: Psicomotricidade Relacional no ambiente educativo (2016), os autores Mastrascusa e Franch apontam para possibilidades de uma atuação livre entre os sujeitos. Com isso, como exemplo, nos revelam alguns combinados feitos junto a um grupo de crianças antes de iniciar uma atividade psicomotora.

Vamos fazer psicomotricidade jogando, explorando, descobrindo e fazendo “inventos”, que quase sempre é muito divertido. Podemos jogar como quisermos, mas há algo que não podemos fazer... [...]. Vamos nos divertir e ficar muito bem, mas não podemos nos machucar nem aos demais, nem destruir o material ou sair da sala sem avisar. (MASTRASCUSA; FRANCH, 2016, p. 38)

De acordo com a prática psicomotora apresentada pelos autores, encontramos a possibilidade de deixar fluir e valorizar as potencialidades corporais do sujeito e regras para uma convivência saudável e harmoniosa no meio social. A expansão do movimento é baseada no conhecimento e no cuidado de si, do outro e do ambiente em que estão inseridos.

Pelo olhar da Psicomotricidade, refletir sobre o que pode o corpo na escola é pensar sobre a potência desses corpos nos espaços escolares nos diferentes contextos inerentes à formação humana de sujeitos autônomos e capazes, entendendo que é a potência de cada indivíduo que o define e o afirma diante da vida. Nesse sentido, devemos tornar possível, criar espaços, dar tempo para afetos que potencializem crianças, jovens e adultos na rede de relações que se estabelecem no ambiente escolar e compreender o corpo que anseia pelo movimento porque é movimento, e que dança ritmado, mesmo estando em posição estática.

Esse movimento do corpo aparentemente estático nos dá pistas da necessidade do movimento corporal. Movimentos que ocorrem na respiração, na circulação sanguínea, no pulsar do coração. Todo esse movimento ritmado afirma a potência do corpo como fonte de vida. Isso significa que potencializar o corpo representa valorizar a vida que existe no interior de cada ser, na construção e desenvolvimento de sujeitos empoderados e conscientes de si, do outro e do meio ambiente em que estão inseridos.

Um funcionário – auxiliar de apoio – de uma das escolas participantes da pesquisa descreveu o que pode o corpo na escola de acordo com sua experiência: “Saber onde começa e termina seu espaço, sabendo cuidar do próximo, pois todos são membros desse grande corpo onde cada membro deve respeitar e cuidar um do outro”.

Nessa mesma instituição, pelo olhar de uma estagiária, que afirma a necessidade de potencializar o corpo e também de ressignificar algumas práticas paradigmáticas ainda vivenciadas em algumas escolas, temos o seguinte relato:

Ao ler a pergunta, logo me veio à cabeça: de que corpo estamos falando? Porque temos na escola vários corpos com funções diferenciadas e, com isso, a possibilidade do que pode ou não fazer. O corpo na escola pode ser docilizado para que “obedeça” às estruturas sociais que temos, ou pode ser um corpo onde se potencialize, empodere, um corpo criativo que rompa com determinadas questões.

Em uma instituição da rede pública federal, uma responsável de estudante nos mostra, de forma profunda, o poder e a simplicidade que afirma o movimento e a liberdade do corpo na escola, nos relatando que “O corpo pode ser livre, pode pular, pode experimentar, pode crescer, pode ser.”.

Cada um dos atores que fazem parte da escola, revela sua forma de pensar e seu olhar para o que pode o corpo no ambiente educacional. O corpo pode ser livre. Será?

Considerações finais

Sem respostas certas ou erradas, podemos apenas afirmar que há a busca por novos paradigmas que afirmem a potência do corpo na escola, com práticas inovadoras, significativas, que contribuem para a construção de conhecimentos e na formação de sujeitos capazes e conscientes de suas ações no ambiente natural e social da qual fazem parte.

É importante refletirmos sobre o desejo que move o sujeito para as descobertas do mundo ao seu redor e na construção do conhecimento que surge a partir de seus interesses e curiosidades. Pensar o papel do corpo na escola na perspectiva de um corpo livre e potente se faz na relação entre os atores da escola na busca de liberdade e possibilidades de desenvolvimento de sujeitos que possam viver em sua inteireza com vontade de potência, sujeitos capazes de transformação e conhecimento sobre si, o outro e a natureza, compreendendo-se como parte do ambiente em que vivem.

É de suma importância ter a consciência dos mecanismos de poder aos quais somos submetidos e fazemos parte inclusive como reprodutores dos mesmos, pois fomos educados e constituídos a sermos assim. Não podemos negar nossa cultura, nossa educação, nossa formação. Ela também está lá, na escola!

Como professores e educadores, somos destinados a nos conscientizarmos do nosso lugar político, econômico e social dentro de tais instituições, reconhecendo nossas atuações, crenças, limitações, mas, também, percebendo nossas potencialidades. Tal necessidade amplia a importância dos estudos apresentados, pois não há como escrever sobre o corpo na escola, ou melhor, sobre o corpo e a escola aos quais nos referimos, sem mencionar tais mecanismos e, ao mesmo tempo, tais potências.

Essas forças se relacionam constantemente, de forma consciente ou não, em atrito ou em harmonia, na escola ou fora dela. Faz parte da vida e, se faz parte da vida, não há como deixar de fazer parte da escola.

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